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sexta-feira, 24 de abril de 2015

Estudo sobre sexo do Stegosaurus é contestado!


Na paleontologia nada é perfeito né... nunca foi e nunca vai ser, a começar pelo fato do registro fóssil não ser completo. Mas de vez em quando, um estudo publicado é criticado e invalidado por opiniões contrárias. Isto parece estar acontecendo com o novo estudo sobre dimorfismo sexual no dinossauro Stegosaurus mjosi, sobre o qual eu publiquei um texto aqui ontem mesmo. Bem, críticas severas ao trabalho de Evan Saitta estão aparecendo e é sobre elas que trataremos aqui hoje! Clique em "Leia Mais" e saiba mais sobre essa controvérsia.

Bom, lendo o texto original que eu publiquei ontem dá pra saber do que o estudo trata, certo? Eu simplesmente publiquei uma tradução da notícia em inglês e me abstive de opinar nesse caso, mais por falta de tempo do que qualquer outra coisa. Mas hoje decidi reservar uns minutos e focar um pouco mais na questão.

Vejamos um resumo do que aconteceu com Saitta:
  • Em 2009 Saitta, ainda no ensino médio, se voluntariou para ajudar em uma escavação em Montana;
  • Seguiu a carreira acadêmica na área da paleontologia, graduou-se na Universidade de Princeton e hoje é um estudante de pós-graduação da Universidade de Bristol no Reino Unido;
  • Ele escavou cinco esqueletos de Estegossauro todos desmontados e embaralhados em Montana e notou diferenças entre as formas das placas;
  • Comparando com esqueletos de estegossaurídeos de outras regiões do mundo, principalmente esqueletos no Museu de Dinossauros Aathal, na Suíça reconstruiu seus esqueletos;
  • Afirmou que machos têm placas largas e ovais e fêmeas portariam placas estreitas e mais pontudas;
  • Para chegar a essa conclusão usou um sistema de eliminatória, a fim de excluir outras explicações como diferenças de idade ou mesmo de espécies (mais sobre aqui);
Porém, paleontólogos já veteranos e bem sucedidos em suas carreiras como Kevin Padian, da Universidade da Califórnia em Berkely e Ken Carpenter, paleontólogo da Universidade do Estado de Utah, estão criticando seriamente o estudo. 

Vejamos um apanhado de seus argumentos:
  • Padian disse que se fosse o avaliador da publicação, "teria rejeitado o trabalho com base em vários problemas".
  • Padian afirma que Saitta identificou incorretamente as estruturas do tecido ósseo e que não há evidência que o animal parou de crescer; O fato dos ossos estarem todos embaralhados não permite o uso de outros ossos, como fêmur, para confirmar que os animais eram adultos ao morrer;
  • Kevin Padian diz que "é bom que Saitta considera outras hipóteses, mas seus dados, do jeito como foram apresentados, não são suficientes para testar nenhuma delas.
  • Ken Carpenter, diz que muitos dos esqueletos suíços usados por Saitta como base para sua análise não estão completos, contem réplicas de placas de outras espécies. Pode ser que S. mjosi tivesse placas tanto largas e ovais quanto estreitas e pontudas em diferentes partes das costas. Fósseis desse tipo já foram achados (imagino que ele se refira ao Kentrosaurus por exemplo), diz Carpenter, um fato que Saitta igora. Ele estaria se apoiando em evidências muito fracas.
  • Vários críticos, incluindo Padian, também citam problemas com os ossos que Saitta escavou em Montana. Eles são propriedades de um coletor de fósseis comercial, Nate Murphy, diretor de uma empresa chamada Judith River Dinosaur Institute.
  • Em entrevista, Padian diz que "esses são espécimes em coleções privadas e a ética de nossa profissão é que não se deve publicar sobre eles."
  • "Não importa se eles se denominam como Judith River Dinosaur Institute (traduz-se como Instituto de Dinossauros do Rio Judith) ou qualquer coisa que seja," reforça Padian, "esses espécimes não estão sob custódia pública".
  • Alguns paleontólogos se preocupam que fósseis em coleções privadas podem ser leiloados e desaparecer da literatura científica para sempre. Outros fósseis de propriedade particular já encararam a mesma controvérsia.
Saitta ainda tenta se defender das críticas dizendo:

  • Sobre as amostras do tecido ósseo, mantém sua posição, reforçando que acredita estar correto quanto sua interpretação do tecido. "Tudo que alguém precisa fazer é comparar imagens com as que eu fiz no meu estudo e ver as similaridades," ele completa.
  • Ele diz que não se deve importar-se com quem é dono dos ossos, simplesmente se pode-se acessá-los para estudo. Conclui ainda dizendo que "estes estegossaurídeos estão acessíveis e sempre estarão e que deseja as pessoas foquem na ciência e não no proprietário dos fósseis."

Me sinto na obrigação de comentar sobre tudo isso aqui, então vamos lá. Ao ler a notícia ontem, me pareceu interessante de fato, não posso negar e achei legal haver a possibilidade de diferenciar macho e fêmea nem que fosse desta única espécie de dinossauro.
Porém ao mesmo tempo fiquei com a sensação de que o estudo não estava me convencendo de verdade de que realmente as análises foram conclusivas. Me parecia apenas mais um daqueles estudos repletos de suposições ou inferências mais liberais, como a galera já propôs para outros dinos como ceratopsídeos entre outros.
O problema maior que eu via nesse estudo era que o autor, Saitta, soou definitivo demais, me pareceu muito assertivo em relação à afirmação que fez de que seu estudo mostra a primeira prova concreta de diferenciação entre sexos nos dinossauros. Inferências e deduções estão a quilômetros de distância de ser provas concretas, preciso admitir e isso me deixou com a noção de que não demoraria muito para alguém descer a lenha nesse trabalho. Não estava errado, em questão de um ou dois dias já temos as repercussões.
Então, de fato, lembro a você leitor que na paleontologia, nem tudo é preto e branco, tem muita coisa cinza por aí e não adianta ficar querendo respostas definitivas sobre algo que viveu ou aconteceu há mais de 65 milhões de anos. Até alguém criar uma máquina do tempo, se é que isso um dia será possível, não saberemos nada com 100% de certeza.
Agora nos resta esperar e ver o desenrolar da história. Será que Saitta apresentará mais dados, com maior peso e comprovará sua hipótese? Ou seu trabalho será desacreditado pela comunidade científica? São cenas do próximo capítulo...


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