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domingo, 17 de março de 2019

Dunkleosteus

Dunkleosteus em vida
© Arte por Hugo Salais - Cores por Patrick Król Padilha



E aí galera, bora aprender um pouco sobre o incrível peixe pré-histórico Dunkleosteus? Talvez você tá tenha ouvido falar dele, mas aqui nessa postagem você saberá de tudo em detalhes sobre esse gênero de animal extinto, então se segura aí e bora mergulhar nos mares devonianos em busca desse monstro! 

Começamos com uma ficha básica dele, que na realidade você já encontra no card acima, mas aqui apresento escrito com algumas informações adicionais, como espécies extras dentro do gênero.

Nome popular: Dunkleosteus 
Nome Científico: Dunkleosteus terrelli, D. belgicus D. denisoni, D. marsaisi, D. magnificus, D. missouriensis, D. newberryi, D. amblyodoratus e D. raveri.
Significado do nome:  Dunkleosteus quer dizer "Ossos de Dunkle".
Quando viveu: Período Devoniano, idades Frasniano e Famenniano, de 382 a 358 milhões de anos.
Local: Canadá, Bélgica. Estados Unidos, Marrocos e Polônia.
Peso: 1 tonelada.
Tamanho: 6 a 8,79 metros de comprimento e 1,8 metros de altura.
Alimentação: Carnívora, especialmente peixes e moluscos.

Para completar, vale conferir na tabela abaixo, que representa a Era Paleozoica, em que posição temporal viveu o Dunkleosteus, marcado em vermelho vivo.  Lembrando que a tabela mostra os períodos mais antigos embaixo e o mais recente no topo.

O Dunkleosteus é um peixe pré-histórico que só agora tem começado a se popularizar na mídia, mas sua história começa há muito tempo. Seus primeiros fósseis foram encontrados nos Estados Unidos, ainda no século 19 por Jay Terrell, no município de Shefield Lake, estado de Ohio. Jay era um dono de um hotel local e tinha como hobby coletar fósseis na região com seu filho enquanto caminhava pela praia (suponho que nas praias do Lago Erie). Em meados de 1867 encontrou os primeiros ossos do peixe gigante que apelidou de "Peixe Terrível". Os ossos viriam a ser descritos por John Strong Newberry em 1873 como Dinichthys terrelli

O primeiro fóssil descrito do Dunkleosteus não era tão completo e por isso acabou sendo considerado o mesmo animal que Dinichthys por vários anos, mas após novos esqueletos fósseis terem sido encontrados, predominantemente compostos de placas ósseas do exoesqueleto do peixe e suas mandíbulas, pôde-se perceber que se tratava de um animal diferente. 
Alguns dos fósseis mais bem preservados desse peixe foram encontrados na região de Cleveland, nas margens do Rocky River, em estratos de xisto devoniano denominado Xisto Cleveland (Cleveland Shale).
Esse xisto era bem conhecido por pesquisadores do museu local como um depósito rico em fósseis de peixes devonianos, inclusive tubarões e placodermos. Em 1928 Peter Bungart e Jesse Earl Hyde faziam prospecção pelas margens do rio quando avistaram uma concreção promissora no meio do barranco íngreme. Escalando, Peter chegou ao local e constatou a presença de ossos de um animal. Após obter a licença da administração do parque para escavar, afinal o rio se situava numa reserva natural da cidade, os pesquisadores realizaram uma extensa escavação a seis metros de altura do leito do rio e conseguiram coletar os blocos de rocha contendo o fóssil do peixe. 
Escavação do Dunkleosteus em 1928
© Jesse Earl Hyde Collection

Eles não sabiam exatamente o que estava preservado nos blocos colectados, que foram levados ao Museu de Cleveland para preparação. Após 8 anos de limpeza dos ossos, eles foram completamente removidos da rocha e puderam ser reconstruídos na posição que adotavam em vida. Ali naqueles blocos Peter e Jesse tinham encontrado o mais completo e bem preservado exemplar de Dunkleosteus (na época ainda Dinichthys) já descoberto no mundo até então. Esse achado colocou o museu local no mapa e foi uma grande descoberta permitindo entender melhor o peixe.
Com o passar do tempo novos espécimes foram sendo encontrados em outras áreas dos Estados Unidos e Canadá, bem como na Europa, incluindo Bélgica e Polônia e também no Marrocos na África. À primeira vista isso dá a impressão que o Dunkleosteus vivia por todo o planeta, mas na prática não. No devoniano estas regiões estavam mais próximas de si, pois na época a configuração continental era completamente diferente de hoje. Partes da América do Norte e Europa estavam unidas e a maioria das rochas que formariam os continentes que conhecemos hoje estava debaixo da água. Um mar estreito separava estas porções de terra do norte de outro grande continente, Gondwana ao sul. No mapa abaixo você pode ver as áreas em azul claro, representando os mares rasos costeiros onde o Dunkleosteus vivia.
Mapa Mundi do Devoniano Tardio - Há 370 Milhões de anos
© Ron Blakey, NAU Geology

O nome Dunkleosteus em si foi cunhado somente em 1956 por Jean Pierre Lehman que reconhecendo diferenças claras entre o Dinichthys e Dunkleosteus separou os em dois gêneros.  O seu nome combina os termos do Grego antigo osteus (οστεος), que quer dizer "osso", e Dunkle, em homenagem a David Dunkle, especialista em peixes fósseis, especialmente no gênero Dinichthys e ex-curador de paleontologia de vertebrados do Museu de História Natural de Cleveland. O epíteto específico "terrelli" era uma homenagem a Jay Terrell, o descobridor dos fósseis originais e foi mantido após a mudança do nome do gênero.
Dentre diversos fósseis encontrados, várias descrições deram origem a espécies diferentes dentro do gênero Dunkleosteus. No geral os fósseis consistem do exoesqueleto craniano do peixe, ou seja, somente as placas de osso que compunham sua cabeça e mandíbulas. O resto do corpo geralmente não é encontrado fossilizado. Abaixo você confere uma lista das principais espécies e indicações da origem de seus fósseis e alguns traços particulares mais marcantes.

D. terrelli: A espécie Tipo, ou seja, que serve de modelo do gênero, é D. terrelli. Até hoje é a maior e mais bem conhecida de todas. Tem um focinho arredondado e os fósseis provém de estratos do Famenniano e Frasniano dos Estados Unidos, rochas bem do final do período Devoniano. Restos do peixe foram localizados nos depósitos de xisto de Huron e Cleveland, no estado de Ohio, mas também em Pennsylvania, Tenessee, Califórnia e possivelmente Texas. Além dessas localidades essa espécie foi também encontrada na Europa.
Crânio reconstruído do Dunkleosteus terrelli
© Field Museum

D. belgicus: é conhecido a partir de fragmentos originários de rochas do Famenniano da Bélgica. Apesar de ser reconhecido como um Dunkleosteus, sua classificação e identificação não é segura, pois sua descrição não é tão confiável, uma vez que uma placa óssea descrita como suborbital na realidade teria sido, aparentemente uma placa anterolateral, o que faz sua descrição ser um pouco duvidosa.

D. denisoni: foi descrita com base em uma pequena placa dorsal medial, cuja aparência é típica do gênero Dunkleosteus, mas que apresenta tamanho bem menor que o normal.

D. marsaisi: se refere à espécie criada com base nos fósseis do Devoniano Tardio do Marrocos, especificamente do Famenniano inferior das Montanhas Atlas. Difere em tamanho das outras espécies, os crânios conhecidos tendo em média 35 centímetros de comprimento, além de ser diferente em formato quando comparado a D. terrelli. Essa espécie do Marrocos tem um focinho mais fino e uma fenestra pós-pineal poderia estar presente. Muitos pesquisadores e autoridades no assunto consideram essa espécie um sinônimo de D. terrelli enquanto alguns pensam que poderia ser um outro gênero.
Crânio reconstruído do Dunkleosteus marsaisi
© Autor desconhecido

D. magnificus é um grande peixe placodermo do Frasniano de Nova Iorque. Foi originalmente descrito como "Dinichthys magnificus" por Hussakof e Bryant em 1919. Em 1932 passou por uma nova descrição feita por Heintz, que o renomeou como "Dinichthys mirabilis" e por fim em 1971 Dunkle e Lane moveram a espécie para o gênero Dunkleosteus.

D. missouriensis: é conhecido de fragmentos encontrados no Missouri, também de idade Frasniana. Dunkle e Lane consideraram-nos como sendo muito similares a D. terrelli

D. newberryi: é conhecido primariamente de um infragnathal (mandíbula inferior) de 28 centímetros de comprimento com uma cúspide proeminente, encontrado no Grupo Genessee de Nova Iorque, datado do frasniano, descrito originalmente como "Dinichthys newberryi".

D. amblyodoratus: é conhecido de restos datados do Devoniano canadense, da região de Kettle Point. O nome da espécie quer dizer "lança cega", referindo-se à forma como as placas nucais e paranucais na parte traseira da cabeça geram a forma de uma ponta de lança cega, não pontiaguda. Embora seja conhecido só de fragmentos, é estimado em cerca de 6 metros de comprimento.

D. raveri: é um pequeno Dunkleosteus, possivelmente com 1 metro de comprimento, descrita a partir de um teto de crânio tridimensional, encontrado em uma concreção carbonática perto da base do xisto Huron, nos estratos do xisto de Ohio. Além de seu tamanho pequeno, tinha olhos comparativamente grandes. Devido a D. raveri ter sido achado em estratos diretamente abaixo das camadas contendo D. terrelli, D. raveri pode ser considerado um possível ancestral da espécie maior. 
Para entender este terrível peixe, precisamos primeiramente compreender sua classificação evolutiva dentro da árvore da vida. O Dunkleosteus é um gênero extinto de peixe placodermo artrodiro que existiu durante o período Devoniano tardio, entre 358 e 382 milhões de anos atrás, uma época que é conhecida como "Era do Peixes", pois os principais animais vertebrados do planeta eram de fato os peixes, pois os tetrápodes, animais vertebrados terrestres somente estavam começando a surgir. Para quem não conhece, o termo Placodermo significa "pele com placas", porque esse grupo de peixes primitivos era revestido com placas de osso na região da cabeça, como um exoesqueleto.
Placodermos de diversas espécies: um grupo bem diverso de animais
© Kawasaki Satoshi

Esses peixes foram os primeiros vertebrados a possuir verdadeiras mandíbulas, alguns tendo dentes verdadeiros e outros tendo apenas placas ósseas afiadas que funcionavam como verdadeiras guilhotinas, similares a bicos de tartarugas, como é o caso do peixe aqui apresentado. Até onde se sabe, existiram tanto placodermos cobertos de escamas como alguns de pele nua, como peixes de couro modernos. Algumas espécies de placodermos, nomeadamente Incisoscutum, Materpiscis e Austroptyctodus, são conhecidos por preservar evidências de que davam à luz aos filhotes em vez de botar ovos, sendo os exemplos mais antigos conhecidos desse tipo de parto comprovando fertilização interna.

Já o termo Arthrodira se refere ao clado de peixes primitivos dotados de armaduras cuja articulação especial permitia movimentos característicos do crânio, daí o nome Arthrodira, que significa "pescoço articulado". Graças a essas articulações esses peixes conseguiam desferir mordidas potentes e abrir a boca consideravelmente. Isso tudo faz parte da compreensão da classificação biológica do Dunkleosteus, sendo que temos a seguinte categorização:

Reino: Animalia 
Filo: Cordata
Classe: Placodermi
Ordem: Arthrodira
Família: Dunkleosteidae
Gênero: Dunkleosteus
Espécie: Dunkleosteus terrelli (espécie Tipo) e as demais listadas acima na seção "Fósseis".

Vale comentar que antigamente o Dunkleosteus era originalmente colocado na família Dinichthyidae, a qual é composta principalmente de grandes peixes carnívoros. Em um estudo mais recente, Anderson (2009) sugeriu que devido à estrutura primitiva da mandíbula o Dunkleosteus deveria ser posto fora dessa família. No ano seguinte Carr e Havin (2010) publicam um artigo no qual ressuscitaram a família Dunkleosteidae e incluíram nela o Dunkleosteus, Eastmanosteus e alguns outros gêneros da família Dinichthyidae, tornando a família Dinichthyidae uma família monoespecífica, contendo apenas o gênero Dinichthys que só possui, por sua vez, uma espécie.
Cladograma mostrando a classificação do Dunkleosteus
© Retirado de Zhu et al. (2016)

A maior espécie dentre as várias no gênero foi D. terrelli, cujo tamanho chegava aos 8.79 metros de comprimento e provavelmente pesava 1 tonelada. Poucos placodermos chegavam a rivalizar com ele em tamanho. No passado chegou a ser estimado em tamanhos ainda mais assustadores, batendo a marca dos 10 metros de comprimento, porém a estimativa mais conservadora é de aproximadamente 6 metros em média, com um exemplar (CMNH 5936) estimado em 8.79 metros por Ferrón et al. (2017) o que ainda o mantém como a maior espécie de peixe placodermo que já foi descoberta. Os autores usaram como base de cálculo do tamanho a proporção do diâmetro da abertura mandibular com o hábito de vida pelágico e nicho ecológico similar a tubarões modernos, para obter esse valor.
Sua aparência é bem assustadora à primeira vista e as reconstruções de seu corpo em vida variam muito, com ilustrações mostrando-o de diversas formas. Isso se deve ao fato de que seus fósseis consistem principalmente das seções frontais couraçadas e consequentemente a aparência das porções posteriores do peixe é praticamente desconhecida. Por causa disso, muitas reconstruções desse gênero mostram uma região traseira baseada em artrodiros menores, como o Coccosteus, cujos fósseis preservam essa região do corpo. 
Fóssil do gênero Coccosteus 
© Adaptado de foto da Wikimedia Commons

Por esta razão reconstruções antigas do Dunkleosteus mostravam-no com um corpo longo e esguio com uma cauda de um lobo único sem divisões, lembrando a forma de uma enguia. Por muitas décadas esse foi o padrão mais aceito de cauda para esse grande placodermo, o que talvez tenha contribuído para o exagero nas estimativas de comprimento, beirando os 10 metros.
Modelo antigo do Dunkleosteus: repare na cauda e corpo comprido
© Escultura por Max Salas

Dunkleosteus: repare na cauda sem bifurcação
© Autor Desconhecido

Dunkleosteus já com um perfil mais curto, mas ainda com a cauda simples
© Kawasaki Satoshi

A nossa visão da aparência geral do desse peixe começou a mudar nos últimos tempos e uma nova descoberta de um espécime excepcionalmente bem preservado de D. terrelli nos ajudou a rever sua aparência. Esse fóssil preservou restos de ceratotríquia em uma nadadeira peitoral, que são estruturas que foram os raios das nadadeiras em peixes elasmobrânquios como tubarões e outros condrictes. Isso implica que a morfologia das nadadeiras de placodermos eram muito mais variável do que se pensava previamente e isso era influenciado principalmente por requerimentos locomotores.
Fóssil de Dunkleosteus (C) articulado e visto ventralmente
Observe no detalhe acima, as ceratotríquia (B)
© Retirado de Carr et al. (2010)

Em outras palavras, isso quer dizer que nem todo placodermo seguia o mesmo padrão de aparência e estrutura corporal e portanto não bastava apenas copiar a aparência de placodermos menores para reconstruir o Dunkleosteus. Essa informação e outras evidências sugerem que a morfologia de peixes é mais influenciada por nicho alimentar do que filogenia (parentesco), ou seja, o modo como o bicho se locomovia e em que parte da água preferia viver e caçar ditava o formato de seu corpo. Por isso podemos ver que peixes que vivem em mar alto aberto tem forma diferente de peixes que habitam o fundo colados ao solo do oceano e assim por diante.
Isso permitiu que o estudo de Ferrón e seus colegas em 2017 inferisse a forma do corpo e mais especificamente da nadadeira caudal do D. terrelli. Essa nova reconstrução sugere um hábito de vida pelágico de mares rasos, ou seja, um animal que nadava no mar aberto longe do fundo. Isso dá a ele um corpo muito mais parecido com o de um tubarão, incluindo um forte lobo inferior na cauda em contraste com reconstruções baseadas em placodermos menores, que tem a cauda fina e sem bifurcação. Não só isso, com base no nicho ecológico os autores sugerem uma coloração com contra-sombreamento, como mostram na ilustração do artigo, com o dorso escuro e ventre claro, padrão comum em peixes grandes pelágicos como os tubarões de hoje.
Inferências da forma da cauda do Dunkleosteus para diversos espécimes 
© Retirado de Ferrón et al. (2017)

Mas sem dúvida, o que realmente chama atenção no Dunkleosteus era seu exterior couraçado que o tornava provavelmente um nadador lento, mas poderoso e de pele resistente, um verdadeiro predador de topo ameaçado por quase nada em seu ambiente. Em vez de dentes, o Dunkleosteus tinha dois pares de lâminas afiadas que se formavam do osso do crânio e da mandíbula, quase como bicos. Ao fechar a boca essas lâminas se cruzavam, mantendo-se sempre afiadas e sendo capazes de desferir um corte preciso e mortal, praticamente decepando as vítimas no meio, dependendo de seu porte.

O Dunkleosteus possuía um mecanismo de ligação de quatro barras, segundo proposto por Anderson (2009), usado para abrir sua mandíbula e que incorporava conexões entre o crânio, escudo torácico, mandíbula inferior e músculos mandibulares ligados por juntas móveis. No desenho abaixo retirado do estudo original, podemos ver um desenho simplificado do crânio com setas representando as ligações dos músculos do animal e na foto do crânio à direita o modelo de quatro barras, porque os pontos de articulação ao serem conectados formam quatro barras entre as articulações marcadas por círculos brancos. Notem as setas indicando a direção do movimento, em que tanto crânio e mandíbula se movem, pra cima e para baixo respectivamente, além de deslocarem-se para trás, permitindo uma abertura considerável da boca do animal.
Diagrama biomecânico da mordida do Dunkleosteus 
© Anderson (2009)

É mais fácil compreender o mecanismo de suas articulações visualizando de fato a ação no gif animado abaixo, em que a pesquisadora do Museu Americano de História Natural mostra um modelo reduzido do crânio em ação. O mecanismo permitia também que o peixe abrisse a boca em velocidade altas, abrindo em 20 milissegundos e completando a ação em até 60 milissegundos, velocidade comparável com predadores por sucção de hoje.
Modelo do crânio do Dunkleosteus 
© Retirado de Shelf Life: 6 Extinctions in 6 Minutes - AMNH

Predadores marinhos que caçam com auxílio de sucção geralmente apresentam bocas grandes que abrem rápida e violentamente, causando um vácuo momentâneo na frente da boca, que puxa a água do ambiente para dentro dela. Se uma presa está passando pela frente da boca do predador, ao abrir rapidamente suas mandíbulas, a sucção ajuda a arrastar a presa para o alcance dos dentes ou até mesmo completamente para dentro da boca. Alguns peixes fazem isso e engolem a presa inteira quando ela é pequena o suficiente. Já o Dunkleosteus provavelmente não engolia a sua comida sem antes triturá-la com as suas lâminas. A sucção portanto deveria ajudar a atrair a presa para o ponto exato que o peixe desejava e assim ele precisava somente fechar a boca, cortando velozmente a presa.
Exemplo de peixe moderno usando sucção para capturar presa

Dunkleosteus atacando uma carcaça enquanto tubarões diversos roubam pedaços
© Steve White

Além disso essas articulações forneciam muita força, permitindo que causasse até 755 quilos de pressão na mordida, o que é uma das mais fortes registradas no reino animal, próxima dos grandes tubarões brancos modernos e até mesmo alguns crocodilos. As pressões geradas nas regiões das lâminas dentares eram suficientes para perfurar ou cortar couraças grossas, sugerindo que o D. terrelli era adaptado a predar presas de nado livre dotadas de couraças, como os moluscos amonites, com suas conchas duras e outros peixes placodermos da época.
Inclusive um estudo realizado por Lee Hall e colegas em 2016 mostra evidências de que talvez o Dunkleosteus fosse até mesmo canibal, atacando sua própria espécie. Essa hipótese foi levantada após análises de placas ósseas do crânio repletas de marcas de mordidas, com inclusive áreas do osso fraturada. Esses ossos marcados por mordidas eram de áreas da lateral e parte de trás do crânio, próximo da região das brânquias, o que faria sentido. Um predador que pretende abater uma presa rapidamente preferiria atacar regiões vitais como essa. Além disso, Hall e colegas acreditam que o único animal devoniano capaz de desferir golpes poderosos assim em um Dunkleosteus e sua couraça, seria apenas outro Dunkleosteus. É plausível que esse peixe praticasse o canibalismo, atacando indivíduos da mesma espécie para alimentar-se, porém há também outras possibilidades para explicar tais evidências. Lutas por competição territorial seriam também razões para explicar tais ataques.
Osso de Dunkleosteus com marcas de mordida: evidência de canibalismo?
© Lee Hall

Fósseis do Dunkleosteus são frequentemente achados com fósseis de bolos alimentares, contendo ossos de outros peixes parcialmente digeridos. Dessa forma, supõe-se que o Dunkleosteus frequentemente regurgitava ossos das presas em vez de digeri-los por completo. É possível que ao engolir presas inteiras ou pedaços granes, os ossos da sua refeição permanecessem inteiros e grandes demais para passar no trato digestivo, assim vomitar estes restos seria uma boa maneira de se livrar de um rango indigesto.
Estudos Morfológicos das mandíbulas inferiores de D. terrelli juvenis revelam que eles eram proporcionalmente tão robustos como os adultos, indicando que já tinham a habilidade de produzir mordidas poderosas desde pequenos e que por isso conseguiam caçar ou dilacerar tecidos resistentes de presas duras, embora em escala menor. O padrão está em contraste direto com a condição comum em tetrápodes de que mandíbulas de juvenis são mais gráceis e fracas que as de adultos. Entretanto um trabalho apresentado por Boyle e colegas em (2016) revelou que existem algumas diferenças sim e que em média os adultos possuem mandíbulas inferior mais compridas e com cúspides maiores, o que forneceria uma adaptação ainda maior para quebrar presas duras.
Escultura de um Dunkleosteus terrelli
©  Esben Horn/10 Tons

Escultura de um Dunkleosteus terrelli
©  Esben Horn/10 Tons

Outro aspecto sobre a aparência desse grande placodermo é a forma como sua face em si é reconstruída em peças de paleoarte. Alguns anos atrás surgiu um debate sobre qual seria a extensão dos tecidos moles faciais do Dunkleosteus e se suas enormes placas dentárias permaneciam sempre expostas ou se em vida algum tecido mole recobria a face, tirando um pouco o aspecto feioso do peixe. Até o momento não pude encontrar resposta definitiva sobre essa discussão e se houve consenso a respeito por parte da comunidade científica. Mas deixo abaixo um par de ilustrações do talentoso Vitor Silva, que mostram o mesmo animal com as duas reconstruções possíveis.
Dunkleosteus com as placas dentárias expostas
© Vitor Silva

Dunkleosteus com as placas dentárias cobertas por tecido mole
© Vitor Silva

Por último nos resta comentar sobre algumas pesquisas sobre placodermos que sugerem que eles estavam entre os primeiros animais a internalizar a fertilização dos ovos, como se vê em tubarões modernos. Algumas espécies de placodermos foram encontrados ainda com filhotes em desenvolvimento dentro do ventre, provando que havia a fertilização interna e a mãe dava luz aos filhotes já formados em vez de pôr ovos. Também existem indícios de que alguns placodermos fizessem berçários, ou seja, os filhotes permaneciam agrupados em regiões mais seguras, rasas próximas à costa, até terem tamanho grande o suficiente para aventurar-se nos mares abertos do Devoniano.

Desde sua descoberta o Dunkleosteus causou alvoroço no público leigo e na cultura popular, mas em uma era pré-internet, sua popularidade se limitada aos museus que expunham seus fósseis e aos livros de paleontologia e fósseis. Sempre que possível autores incluíam menções ao "Dinichthys" em suas obras sobre evolução ou animais primitivos, como um grande monstro marinho. Isso rendeu ao Dunkleosteus uma popularidade de ser um gigantes dos mares e um dos mais temidos animais que já viveram. 
No ano de 1993 o peixe fez uma aparição na coleção "Dinossauros - Descubra os Gigantes do Mundo Pré-histórico", no Brasil publicada pela Editora Globo. O peixe foi o animal principal do fascículo 37, com direito ao pôster central da edição!
Dunkleosteus da edição 37 da coleção Dinossauros
© Editora Globo

Dunkleosteus da edição 37 da coleção Dinossauros
© Editora Globo

Dunkleosteus da edição 37 da coleção Dinossauros - pôster central
© Editora Globo

Mas ainda assim sua fama era limitada e só começou a expandir com o surgimento das mídias digitais nas últimas décadas e então o animal pôde estrelar em documentários famosos da vida pré-histórica como em "Sea Monsters" da BBC em 2003, em que Nigel Marven viaja no tempo e mergulha no oceano devoniano, fechado em uma gaiola, para conhecer o Dunkleosteus, no mesmo estilo dos mergulhos de observação de tubarões modernos.
Dunkleosteus de Sea Monstes
© BBC

Dunkleosteus atacando a gaiola em Sea Monstes
© BBC

Dunkleosteus atacando a gaiola em Sea Monstes
© BBC

Nos mais recentes jogos de vídeo game de diversas plataformas, de computadores a celulares, a presença do Dunkleosteus tem se tornado mais notável. O peixe foi incluído no jogo de sobrevivência Ark Survival Evolved, sendo representado com um nome de espécie fictícia (Dunkleosteus loricaruptor) em vez do nome científico verdadeiro. Sua aparência no design do jogo é bem estilizada e mostra um animal muito mais exagerado e bastante incorreto em alguns aspectos anatômicos.
Concept Art do Dunkleosteus de Ark
© Ark Survival Evolved

Filmes no estilo Jurassic Park nunca exibiram esse animal, mas os jogos oficiais mais recentes da franquia, Jurassic Park Builder e Jurassic World The Game permitem que o jogador crie diversos animais extintos que não aparecem nos filmes, entre eles o Dunkleosteus.
 Dunkleosteus de Jurassic Park Builder
© Ludia
Dunkleosteus de Jurassic World The Game
© Ludia

No mundo das miniaturas colecionáveis e brinquedos, o Dunkleosteus começou a aparecer há relativamente pouco tempo. O primeiro brinquedo decente produzindo em larga escala foi o Dukleosteus Wild Safari, lançado em 2007 pela empresa Safari Ltd. como parte da coleção Wild Safari. A figura permaneceu por muitos anos como o único boneco desse peixe no mercado e era considerado um ótimo exemplo de figura bem feita, pois trazia uma textura ótima, uma anatomia bem acurada para os conhecimentos da época e uma coloração bem intrigante, ousando no uso de tons dourados metálicos para colorir o peixe.
Dunkleosteus Wild Safari de minha coleção particular
© Foto por Patrick Król Padilha

Posteriormente, no ano de 2014, a empresa japonesa Favorite Co. produziu sua própria versão desse grande predador, um boneco de plástico de alta qualidade que na época causou controvérsia pela adoção de uma cauda de forma diferente da tradicionalmente usada. Lembrando que o estudo sobre a cauda do Dunkleosteus que propõe a cauda estilo tubarão só saiu em 2017, portanto a empresa produziu um boneco à frente de seu tempo, digamos que prevendo a forma mais correta da cauda do peixe. A figura sem dúvida é atualmente um dos melhores modelos e talvez o mais correto cientificamente se levar em conta a forma corporal. Além da versão padrão da linha Soft Models, a empresa fabricou uma versão um pouco maior de material mais maleável para crianças menores, com cores diferentes, mas mantendo o padrão anatômico.
Dunkleosteus Favorite da linha Soft models
© Favorite Co.

Dunkleosteus Favorite da linha mais macia, para crianças menores
© Favorite Co.

Em 2016 a empresa Schleich decidiu entrar na onda com sua própria réplica do peixe Dunkleosteus, tendo lançado uma versão muito legal desse animal, com uma aparência bem grotesca, mas ainda com o padrão de cauda antigo e os "dentes" bem expostos. A textura escolhida é inovadora, pois em vez de seguir a moda de fazer o peixe liso com pele coriácea, aplicou nele uma textura de escamas finas com detalhes maiores, com placas percorrendo a lateral do corpo, provavelmente inspirado na textura da pele de algum placodermo pequeno conhecido. A cor é bem realista e com exceção da cauda incorreta, é um modelo ótimo do peixe. 
Dunkleosteus Schleich
© Schleich

Outra grande empresa fabricante de brinquedos de animais pré-históricos é a CollectA do Reino Unido, que em 2018 lançou sua réplica Deluxe do Dunkleosteus. Um modelo em tamanho grande e pesado, maciço, apresenta o Dunkleosteus muito bem, anatomicamente falando, a cauda infelizmente não é 100% correta, mas aproxima-se da forma proposta no estudo de 2017. É bem provável que a CollectA já estivesse com o modelo esculpido e seus moldes prontos, em plena fabricação quando o estudo saiu sobre a nova aparência do peixe e por isso não havia como voltar atrás. Em média modelos sempre são projetados e fabricados um ano antes do lançamento.
Dunkleosteus CollectA
© CollectA

Ao contrário das demais empresas, a Mojo Fun não pode dar desculpas para a cauda incorreta de seu recém anunciado brinquedo de Dunkleosteus. A figura foi revelada em fins de 2018 como um lançamento de 2019 e ainda nem chegou ao mercado. Na prática deveria ter sido feito com a cauda atualizada de acordo com Ferrón et al. (2017), mas por falta de pesquisar a fundo optaram pela cauda mais no estilo enguia com uma fina barbatana ventral. Não se pode dizer que está completamente errado, mas ainda assim está longe do ideal. Nos demais aspectos a figura é perfeita, acerta no formato geral do animal, corpo robusto, cabeça couraçada e barbatanas fortes, com uma coloração muito bonita e interessante. Pessoalmente adorei a cor amarelo limão, praticamente verde no rosto com as manchas pretas e ventre claro. O sombreamento em marrom destaca a textura que está muito bonita. De todos os brinquedos desse peixe, esse, apesar dos erros, é meu favorito até agora, pela cor e padrões de manchas.
Dunkleosteus Mojo Fun
© Mojo Fun

Se você é colecionador e procura modelos desse peixe ou mesmo de outros animais antigos, visite nossa loja clicando aqui. A Dinoloja tem uma variedade enorme de brinquedos e colecionáveis para sua coleção pré-histórica.





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